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Entregador de Água

O Entregador de Água – Parte 1

Entregador de Água

Imagem: Divulgação

AUTOR: SEGA

    Eu saí de Tietê porque achava a cidade um porre. Não cheguei a ir muito longe, porém. Desci do ônibus em Sorocaba, 72km depois, com uma entrevista de emprego marcada para as 10h do mesmo dia. Sair de um lugar de 30 mil habitantes para um lugar de 300, aos 19, excitava, até o ar me parecia diferente.

***

    Pense em mim como você quiser. Mas pense bonito porque é assim que eu sou. E sendo bonito que eu chamei a atenção do entregador de água da empresa. Fui contratado como Assistente Administrativo e odiava trabalhar ali, mas não por causa do lugar ou da função, só porque odiava trabalhar mesmo, eu achava que não conseguia fazer nada direito, que era péssimo em tudo, embora me elogiassem e pedissem as coisas para mim ao invés da Luana, há mais tempo que eu, na mesma função. Pediam que eu marcasse veterinário para o cachorro, que eu buscasse pão de queijo na padaria, que eu compasse marmita, que eu guardasse um segredo.

    João era o nome dele. “Liga lá pra nós”, eles me diziam. Eu ligava e eles perguntavam: “Que horas o João vem?”

    João era mais ou menos da minha altura, tão magro quanto eu, mas claramente mais forte. Tinha uma tatuagem no pescoço, uma frase que dizia “thinking is my fighting” que eu li quando fiquei ao seu lado, segurando o galão vazio enquanto ele usava os músculos com o cheio. Não era uma frase qualquer, eu pensava. Não era o afago na cabeça que as pessoas costumam tatuar ou escrever nas capas dos cadernos ou nas redes sociais ― não era cafona. Foi Virginia Woolf quem disse isso, segundo o Google. Virginia Woolf, uma escritora inglesa do século XX.

O gato é culto. Tinha mais tatuagens: nos braços, nas mãos, pequenos símbolos nos dedos. Ilhas de figuras sobre o mar de pele morena. Frase, porém, só aquela mesmo. João sorria bastante, a não ser quando fazia força e seu maxilar enrijecia, as sobrancelhas quase se unindo enquanto a mão espalmada encaixava com precisão a cabeça de plástico no suporte. Quando vinha à tarde, sua testa e nuca suavam, seu peito engrandecia na busca do ar e suas mãos descansavam na cintura de uma maneira descontraída, alheio ao efeito que exercia sobre mim.

    A maioria dos meus colegas me olhava diferente, mas porque já tinham sacado que eu era meio veado. Não era afeminado ou fora do armário, mas também não era um jogador de futebol que falava de mulheres e carros, ria alto ou whatever. Quase não falava, me vestia bem, a dicção era perfeita, ficava muito mais à vontade no meio das mulheres. E era novo, né? Queriam me desvendar, queriam que eu contasse sobre uma possível namorada, um romance etc. Nunca tinha tido nada. Não puderam evitar, eu acho. Tão fácil quando ligar um ponto no outro. E por que eu me importaria? Sorocaba era uma metrópole, as pessoas tinham a mente aberta na metrópole.

    Num sábado de manhã, assim que João cruzou a porta após eu ter lhe entregado o dinheiro, Luana disse que podia ouvir meu coração apaixonado bater toda vez que ele chegava. Soa romântico, mas ela disse num tom de deboche, com um sorrisinho de lado. Uma bifurcação se apresentou no meu caminho: eu podia rejeitar aquele comentário e me fechar numa concha ou podia aliviar meus ombros cansados.

    “Será que ele também ouve?”

    Nós dois rimos.

***

    João mal olhou para mim ou para Luana nos outros dias que veio. Não deixou de ser simpático, mas o sorriso era menor e a cabeça inclinava de leve para o chão.

    “Ele ouviu!”, eu disse, rindo, mas extremamente nervoso. “Ele sabe!”

    Luana se divertia e dizia coisas como “e daí?” ou “ele está envergonhado, só isso.”

***

    “Onde tá a Luana?”, ele perguntou, me olhando nos olhos e sorrindo como antes, um mês depois.

    “De quinta ela vai no correio”, dessa vez era eu quem desviava o rosto.

    Entreguei o galão vazio e abri a gaveta para pegar o dinheiro. Ele aproveitou o curto silêncio para dizer o que disse.

    “Que barulho é esse?”, tocou a orelha com o indicador, semicerrando os olhos. “É seu coração apaixonado?”

    Encarei seus olhos me sentindo na beira de um precipício. Seu sorriso não era uma mão estendida, não. Um passo e eu caio.

    “É.”

    Eu não coloco os fones de ouvido quando saio de casa, seja no ônibus ou na rua, porque eu começo a prestar atenção na música e perco um carro passando que pode me atropelar, perco o ponto onde eu deveria descer, perco de perceber alguém andando próximo demais de mim na intenção de me assaltar. Em casa, eu aumento o volume no máximo. Normalmente é um pop sem-vergonha, nada demais, algo para relaxar e me ajudar a passar o tempo sozinho numa quitinete num bairro afastado.

Quando quero algo mais profundo, busco os nomes da MPB, do pop, do rock, que têm o aval dos críticos. Vapor Barato, Gal Costa. Future Lovers, Madonna. Ivy, Frank Ocean. Gloria, Patti Smith. Sertanejo é tudo o que se ouve em Tietê, é a cultura da cidade, a cultura caipira. É o som da viola que toca no rádio de manhã. Desde os meus 14, no meu awakening envergonhado à beira da cama, depois da escola, eu passei a rejeitar toda a cultura que não me acolhia. Não ouvia mais o que meus pais ouviam, nem assistia o que eles assistiam. Busquei novas referências de acordo com o meu novo eu ou pelo menos o eu que eu gostaria de ser a partir daquele momento.

Depois de João, porém, o sertanejo voltou a percorrer meus ouvidos. Evidências, Chitãozinho e Xororó. O peito rasgado daqueles homens, apoiado numa mesa de bar, um microfone pendendo da mão, a voz comprimida na garganta, lutando com o choro, as cordas do violão vibrando e ressonando na rua ― era, tudo isso, o resumo do meu eu interior enquanto minhas mãos esfregavam a privada do banheiro, estendia a roupa no varal, fritava um ovo no óleo usado. Em dois meses eu estava disposto a entregar meu coração para alguém quebra-lo. E quão quente meu sangue passou a ser.

Me masturbava à noite, tocando o corpo de João, lambendo seu pescoço e sussurrando “thinking is my fighting”, apertando e puxando o saco, alisando o pênis, aumentando a fricção, saliva na cabeça latejante e sensível, eu gemia baixinho: me fode, seu filho da puta, me come até gozar dentro de mim, me come, João. E eu explodia.

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3 comentários

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  1. Elis

    MARAVILHOSO, PUTA TEXTO BOM DO CARALHO, ME MASTURBEI HORRORES, SÓ NAO GOSTEI DO NOME DELE SÓ, MAS MEU DEUS, QUERO MAIS CONTOS !!!!


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